quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Uma dupla tarefa: ensinar e educar

Fonte: http://www.educare.pt/

Por: Sara R. Oliveira

A vida dos docentes tem sido atribulada nos últimos anos. As manifestações de desagrado com as políticas educativas sucedem-se, mas há quem continue de pedra e cal a transmitir conhecimentos. O Dia Mundial do Professor é assinalado a 5 de outubro com mais um protesto à porta do Ministério.

Os tempos não têm sido fáceis e este ano as mudanças sucederam-se. O Governo caiu, a ministra Isabel Alçada despediu-se do Ministério, o país foi a votos e a tutela foi assumida pelo matemático Nuno Crato. Pouco depois, era anunciado que os cortes na Educação atingiam os 803 milhões de euros em 2011, mais 500 milhões no próximo ano. Poupar é o verbo mais conjugado. O modelo de avaliação deu pano para mangas, as reuniões com os sindicatos do setor preencheram as agendas e, depois de algumas cedências de parte a parte, os professores serão classificados num processo menos burocrático.

Tiveram de aprender a lidar com um novo Estatuto do Aluno, a assimilar novas regras, a perceber como funciona um mega-agrupamento, a esticar as horas a Português e Matemática. Tiveram de perceber como a reorganização escolar se desenha no terreno. Nos últimos anos, os professores tiveram mãos cheias de alterações para digerir. E o desagrado saiu à rua. A 16 de setembro, as capitais de distrito juntaram professores em protesto contra o desemprego, a precariedade e a instabilidade da classe, numa altura em que cerca de 35 mil docentes tinham ficado sem escola.

A colocação de professores para este ano letivo voltou a abanar o sistema e as acusações cruzaram-se. Os professores acusaram o Ministério de trabalhar com uma plataforma que não tinha espaço para horários completos, a tutela argumentava que nada tinha mudado em relação ao ano anterior. Milhares ficaram sem escola e a revolta aumentou. Na semana passada, 18 docentes dormiram à porta do gabinete do ministro da Educação, nas instalações do Palácio das Laranjeiras, em protesto contra a forma de colocação da segunda bolsa. Tudo porque colegas com menos tempo de serviço e menor graduação tinham passado à frente por se terem candidatado a horários temporários.

O Dia Mundial do Professor é assinalado esta quarta-feira, 5 de outubro, feriado nacional, com mais uma manifestação de professores e educadores contratados no desemprego à porta do Ministério. O protesto é contra a instabilidade e o desemprego vivido pela classe e é organizado pelo Sindicato dos Professores da Grande Lisboa e pela Federação Nacional dos Professores (FENPROF).

O que é hoje ser professor? "É ensinar, mas principalmente educar", responde Ana Fraga, professora de Matemática há 11 anos. Não se arrepende da opção de ensinar até porque há desafios constantes. Continua a acordar com vontade de entrar na sala de aula. "Não existimos só para despejar a matéria, somos mais do que isso. Temos de saber ser amigos dos nossos alunos e cativá-los". E, por vezes, ensiná-los a sentarem-se nas cadeiras, a trazerem lápis e cadernos de casa. Muitas vezes é preciso explicar as regras do jogo. "Adoro aquilo que faço, gosto muito de ser professora", garante.

Manuela Mendonça deu aulas durante mais de 10 anos em várias escolas do país, conheceu várias realidades. Hoje coordena o Sindicato dos Professores do Norte e está atenta a tudo o que se passa nesse mundo. O 5 de outubro não lhe passa ao lado. "Os professores dão rosto ao futuro e é importante que a profissão seja valorizada", defende. "Ser professor hoje, como no passado, é exercer uma profissão de grande relevância social, agora num contexto de maior complexidade", sustenta.

A escola é agora uma grande casa com uma maior heterogeneidade de alunos. E, por isso, há respostas que, em seu entender, deviam ser acauteladas. "A escola não dispõe de equipas multidisciplinares que possam, com os professores, desenvolver um trabalho sistemático do ponto de vista do desenvolvimento dos alunos", repara. Não há psicólogos, assistentes sociais, educadores sociais, em muitos estabelecimentos de ensino. E, por vezes, é feito um "trabalho desadequado que não permite uma intervenção de uma forma mais consistente".

João Dias da Silva, secretário-geral da Federação Nacional da Educação (FNE), deu aulas durante 21 anos. Sempre que entra numa escola, o fascínio pela docência vem ainda mais ao de cima. Deixou de lecionar em 1994 e os tempos mudaram. "Hoje a profissão docente tem características e exigências diferentes de há 20 ou 30 anos. A sociedade transferiu para os professores responsabilidades acrescidas e problemas novos". Em seu entender, ser professor não é pior ou melhor, "cada tempo tem a sua dificuldade", os contextos é que são diferentes. A profissão é exigente e anda de mãos dadas com muitas áreas que se cruzam com os valores para o exercício de uma cidadania plena.

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