quarta-feira, 20 de maio de 2009

Profissão Professor
– entre a ‘des’autoridade e a ‘in’segurança

Numas das aulas de preparação para assinalarmos o Dia do Professor Cabo-verdiano, entre muitos textos produzidos, achei um que fazia referência à profissão do professor como uma “profissão de risco”.
De facto, se formos ver é apenas uma das muitas opiniões pueris em relação ao assunto. Em certa medida, um aluno de 7º ano para chegar a essa conclusão não teve que se esforçar muito isto porque se repararmos as relações entre os professores e os alunos sofreram mudanças profundas nas últimas décadas.
Entretanto, há algumas décadas, verificava-se uma situação injusta, em que o professor tinha todos os direitos e o aluno só tinha deveres e podia ser submetido aos mais variados vexames. Hoje em dia, observamos uma situação, outra vez injusta, em que o aluno pode permitir-se, com bastante impunidade, diversas agressões verbais, físicas e psicológicas aos professores ou a colegas, sem que na prática funcionem os mecanismos de arbitragem teoricamente existentes.
Todavia, as relações nas escolas mudaram, tornando-se, cada vez mais conflituosas. Será que muitos professores não souberam encontrar novos modelos, mais justos e participados, de convivência e de disciplina? Será que se deve abaixar-se e aceitar os novos rituais de cacholeta em nome da tolerância e da perseverança? Ou será que quando se pensou nos Direitos dos alunos alguém se esqueceu dos seus Deveres?
Na verdade, o problema da violência nas escolas é minoritário e isolado, constituindo um simples reflexo do ambiente social dos bairros degradados ou das grandes cidades, pensam alguns. Como que deixando transparecer o seguinte: “é melhor ter um grupo de thugs numa escola a ‘auto’-educar/ a educar os outros do que deixá-los nas ruas a assaltarem as pessoas”. A verdade é que podemos, até, estar a ter autênticos “depósitos de thugismo” nas escolas pensando e resolvendo, apenas, os frutos da violência esquecendo-se do principal: a raiz do problema. E aí, vem a velha questão: de quem é a culpa? A escola diz: é da família. Esta diz: é da sociedade. Não, é da família. Entre o Adão, a Eva e a serpente... Que venha o pecado e escolhe!
Mudou-se, também, a autoridade social pelo professor. O professor do ensino básico e, sobretudo, o professor do ensino secundário com formação universitária gozavam de um elevado “status” social e cultural. O saber, a abnegação e a vocação destes eram amplamente admirados.
Porém, nos tempos actuais o “status” é estabelecido, principalmente, a partir de critérios económicos. Para muitos pais, o facto de alguém ser professor tem a ver com a clara incapacidade de “ter um emprego melhor”, isto é, uma actividade profissional onde se ganhe mais dinheiro.
É evidente que há uma perda de prestígio e autoridade, associada à alteração do papel tradicional dos professores nas localidades: os professores do ensino básico já não são os únicos agentes culturais das aldeias nem os do secundário apenas da elite social da cidade, cujo recrutamento não passa apenas por critérios escolares.
Num rápido olhar temos a impressão que a imagem social e a condição económica dos professores se encontram num estado de grande degradação, sentimento que é confirmado por certos discursos dos sindicatos e das autoridades estatais.
Por isso e, parafraseando J. G. Sacristán “a profissão docente é uma semiprofissão. Em parte, porque depende de coordenadas político-administrativas que regulam o sistema educativo, em geral, e as condições do posto de trabalho, em particular.”
É fundamental que se paute por critérios de grande exigência em relação à carreira docente (formação, reclassificação, progressão, avaliação, etc.). Se os próprios professores não investirem neste projecto é evidente que outras instâncias (Estado, Universidades, etc.) ocuparão o território deixado livre, reivindicando uma qualquer legitimidade de pilotagem da profissão docente.
Entretanto, passar anos investindo na sua carreira sacrificando-se por uma formação em detrimento de momentos que podiam ser de lazer para depois ter que esperar por essas exigências que ficam, em muitos casos, para as calendas gregas deixam qualquer um com sentimentos de desajustamento e insatisfação perante problemas reais da prática do ensino, em aberta contradição com a imagem ideal do professor.
No entanto, o que se pede, na prática, é que seja fundamental dotar a nossa profissão docente de mecanismos de selecção e de diferenciação, que permitam basear a carreira docente no mérito e na qualidade.
No fundo, o que se pede mesmo é a possibilidade de um desenvolvimento profissional (individual e colectivo), que se crie as condições para que cada um defina os ritmos e os percursos da sua carreira e para que o conjunto dos professores projecte o futuro desta profissão que parece reconquistar novas energias e fontes de prestígios.
Neste sentido, é importante repensar os programas de formação de professores, que têm uma incidência mais forte nos aspectos técnicos da profissão do que nas dimensões pessoais e culturais.
Quando digo “basear a carreira docente no mérito e na qualidade” deveria ser de acordo com a APD 10/2000 art. 2º d) “Valorizar e aperfeiçoar o trabalho dos docentes”. Mas, na prática, em algumas escolas, o que se assiste são casos caricatos como tirocinantes como avaliadores, acções feitas em nome de IGE, professores “impedidos” de prosseguir com a sua formação por incompatibilidade com os horários, ou aposentação precose. Tudo isso em nome da qualidade que se espera não ser chinesa.
Entretanto, quando isso sucede, faz-me lembrar Mourinho quando se refere a esse tipo de italianices sicilianas como meretrício intelectual das pessoas que em nome de uma boa avaliação o melhor é vender-se do que ser vendido, preferindo ser o agente da passiva e escondendo-se no seu cafarnaum depois de tomar, às vezes, a sua cacholeta.
Por tudo isso, interpela-nos algumas questões que importa repensar. Por exemplo, como aprofundar o diálogo (se é que ele existe!) entre todos os que intervêm na escola? Como criar, manter e desenvolver espaços de reflexão crítica onde se cultive o confronto de opiniões no equacionar dos problemas?
Repensemos! E... Comemoremos o nosso dia 23 de Abril.

Ricardino Rocha
ricarsir@hotmail.com 9e10dejunho.blogspot.com

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